Potência Amazônica: Como pensamos a relação ciência e negócios na Amazônia?
Palavras-chave: Amazônia, Ciência e Negócios
A Amazônia Legal representa 59% do território brasileiro, abrangendo todos os estados da Região Norte, Mato Grosso e parte do Maranhão. O território é a casa de aproximadamente 28,1 milhões de pessoas, sendo extremamente plural em suas realidades.
A região ainda se destaca ao abrigar cerca de um terço das florestas tropicais do planeta, além de atuar na manutenção de serviços ecológicos. Tudo isso evidencia a necessidade de desenvolver formas sustentáveis de economia, visando o desenvolvimento a partir de uma floresta com árvores em pé e rios limpos.
Acreditamos que a ciência, tecnologia e inovação têm um papel fundamental nessa empreitada! Porém, para que isso ocorra e traga impactos positivos reais para a população, algumas perguntas precisam ser respondidas. Por exemplo:
- Como pensamos a relação de negócios da Amazônia?
- O que há de gargalo e quais ações já estão sendo realizadas?
- Qual o nosso papel nessa jornada?
Para responder a essas e outras perguntas, conversamos com a pesquisadora Andrea Waichman. A professora da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) fez mestrado na área de Ecologia e hoje em dia leciona aulas sobre Fundamentos de Ciências Ambientais abordando principalmente temas como sustentabilidade. Andrea também é sócia da startup Darvore, cosméticos da Amazônia, uma deep tech que trabalha ativos da região por meio da nanotecnologia. Vamos lá?
Como é a relação ciência e negócios na Amazônia?
Qual a primeira imagem que passa na sua cabeça quando falamos da Amazônia? Árvores e rios? Onças andando nas ruas, talvez? Índios com flechas prontos para atacar?
Pois é, segundo Andrea Waichman a visão das pessoas – de outros países e outras regiões brasileiras – sobre a Amazônia é muito estereotipada, não correspondendo à realidade da região. Afinal, você sabia que em Manaus existem empresas do setor de tecnologia que já foram vendidas por preços milionários?
Para a pesquisadora é preciso gerar uma imagem diferenciada da Amazônia, mostrando que a região tem muito mais a oferecer do que insumos in natura e que com o seu conhecimento sobre a sua biodiversidade e sua tecnologia é possível gerar uma produção de alto padrão. “Essa é uma questão que estamos trabalhando muito hoje em dia. Por vezes, por exagerar nos estereótipos, não conseguimos diversificar os nossos públicos e encontrar consumidores que geram muito mais renda do que temos hoje”, destaca.
“Trabalhamos nessa perspectiva de desenvolver produtos diferenciados e buscar novos mercados”, conta a pesquisadora.
A ação é fundamental para o crescimento a partir da floresta em pé, pois rever o processo de construção e organização dos negócios desenvolvidos na Amazônia, buscando agregar valor ao que é produzido na região e, consequentemente, uma melhora de vida para a população local.
Capacitação e os empreendedores amazônidas
O caminho não é fácil e para que isso aconteça, investir em educação e capacitação é um quesito extremamente necessário. Porém, essa demanda não está necessariamente ligada ao ensino superior.
Ao trabalhar em uma consultoria para o Ministério da Educação, para identificar lacunas e demandas da capacitação na Amazônia, Andrea percebeu uma grande demanda por cursos mais rápidos como os técnicos. “Percebemos um foco muito grande em cursos que ajudam, por exemplo, a fazer um bom planejamento da produção, ou a entender as rotinas de controle de qualidade das matérias primas e a gerenciar negócios”, conta.
Isso não significa que a Universidade não esteja chegando às pessoas. Ela está – o que é um grande feito para a nossa sociedade. Porém, diferente do que se propagava antigamente, não é preciso necessariamente ter um curso superior para ser um bom gerente de um negócio. “As pessoas estão ávidas por conhecimento e por oportunidades”.
Isso significa que não tem espaço para o empreendedorismo científico? Pelo contrário! O conhecimento científico é essencial para desenvolver novos modelos de negócio.
Andrea dá o exemplo de sua startup Darvore, onde eles desenvolvem produtos manufaturados a partir da tecnologia. Pensada no contexto da sustentabilidade, minimalismo e do não desperdício, a startup tem patentes depositadas e produz cosméticos de alta performance usando nanotecnologia e ativos da floresta amazônica. A iniciativa teve apoio da EMBRAPII e do SEBRAE e desenvolveu os produtos durante três anos, realizando diversos testes.
Gargalos e ações: onde estamos e para onde queremos ir?
Empreender o conhecimento científico tem seus diferenciais! Andrea Waichman sabe bem disso, ela já dirigiu a Gestão de Inovação, Propriedade Intelectual e Transferência Tecnológica da Ufam. Em sua experiência Andrea lembra que um grande ponto de atenção, para quem quer empreender a partir da ciência, é estar atento às demandas do mercado e tentar resolver um problema legítimo da população.
Assim como em outras regiões, nas pesquisas científicas desenvolvidas na Amazônia, isso nem sempre acontece. “Quando eu pesquiso apenas o que eu quero, sem estar atento às demandas e tendências de mercado é muito difícil fazer um casamento entre empresa/universidade ou mercado/universidade”, alerta.
Para Andrea isso é muito importante, uma vez que, ao levar o conhecimento para o mercado, não basta você ter descoberto algo. “Não adianta termos patentes se não a transferimos”, ressalta. Segundo a pesquisadora, há iniciativas nas universidades que visam fazer essa ponte, porém é preciso que a comunidade acadêmica se abra para elas e não veja o mercado com tantas desconfianças como acontece atualmente na região. Em contrapartida, é preciso que a Universidade desenvolva processos mais rápidos e eficazes que não burocratizem tanto essas parcerias.
Infraestrutura
Em uma perspectiva mais macro, Andrea também fala sobre a necessidade de melhoria da infraestrutura da região que enfrenta problemas como, por exemplo, a conectividade. Ela até lembra da ocasião que o Elon Musk rondou o governo sobre o assunto. “É um grande negócio para ele? Sim, mas pode ser um grande negócio para a Amazônia também. Precisamos da tecnologia para desenvolver a região e proteger quem a protege”, destaca. Além disso, é preciso pensar na capacitação das pessoas para mantermos essa estrutura, o que mostra mais uma vez a importância da educação nesse cenário.
Investimento para crescer
Porém, tudo isso só é possível a partir de uma coisa: investimento! Andrea lembra que apesar do tamanho territorial da região, cerca de 59% do território brasileiro, menos de 10% do investimento da ciência é destinado à Amazônia.
“Por vezes falamos da importância da Amazônia e como ela é do Brasil, mas quanto de recurso financeiro estamos colocando ali?”, provoca a professora.
Na ciência esse contexto é ainda mais prejudicial, uma vez que a falta de investimento acaba ocasionando a ‘fuga de cérebros’. “Eles vão para o Sul e Sudeste, pois acreditam que terão mais chances de desenvolver suas pesquisas por lá. Então, precisamos fortalecer a nossa ciência local e os institutos das cidades do interior, que são pontos estratégicos. Não é algo que resolvemos do dia para noite, mas seguimos na luta”, conta Andrea.
Cooperação em foco na Amazônia
Andrea não está sozinha! Segundo Waichman, estamos vivendo um bom momento e é possível ver várias iniciativas, públicas e privadas, que estão trabalhando pela Amazônia. “O que me deixa feliz é que temos muitas iniciativas que estão olhando para esses problemas de forma diferente e querendo que a Amazônia persevere, que dê certo”, conta.
Quer saber mais sobre essas iniciativas? Fique ligado na Deep, a série Potência Amazônica continua e trará mais histórias sobre ciência, empreendedorismo e Amazônia!
Autora: Tuany Alves (jornalista e analista de comunicação pela Wylinka)