Deep Techs e Startups

SATTs: uma nova maneira de alavancar spin-offs nas universidades? 

09/agosto/2023

SATTs é o modelo de aceleradora que já gerou mais de 3.500 patentes e 1.5 bi captados por suas mais de 750 deep techs

O debate sobre a geração de impacto econômico e social a partir da ciência já é antigo, embora os modelos de como fazer isso acontecer estejam em constante teste e melhoria. Aqui na Wylinka, por exemplo, já são 10 anos tentando aperfeiçoar a prática da geração de inovações a partir de universidades no Brasil. Nessa jornada, já atuamos com avaliação e promoção de patentes para a Fiocruz, com o fortalecimento de incubadoras e 117 negócios incubados em Minas Gerais, com a geração de startups científicas a partir de invenções do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, além de diversos outros projetos que você pode conferir aqui.

No texto de hoje, vamos compartilhar com você uma descoberta de um modelo recente desenvolvido na França e que já conta com um impacto espetacular: 755 startups criadas, quase 4.000 patentes prioritárias depositadas, cerca de 1.700 contratos de licenciamento assinados e 1.5 bilhão de euros levantados pelas startups. 

Prelúdio: modelos anteriores que sustentam a ideia dos SATTs

Como dissemos, os modelos de suporte à geração de spin-offs das Universidades são muitos: incubadoras, programas de aceleração, capacitação de cientistas, agências de inovação (ou TTOs), e muito mais. Aqui na DEEP, por exemplo, cobrimos uma série deles (nesta seção aqui você encontra 8 anos de textos que escrevemos sobre o assunto). 

Desses modelos, duas abordagens recentes trazem fundamentos importantes para o modelo dos SATTs:

  • Proof of concept centers: um tema que já trouxemos aqui, os POCCs funcionam como uma espécie de aceleradora de tecnologias da universidade. Sua finalidade é acelerar a prova de conceito da tecnologia com maior proximidade com agentes do mercado (empresas, mentores de mercado e especialistas). Em um combo de processos, mentorias e proximidade com a indústria, busca-se validar, ou aproximar mais, a tecnologia das demandas do mercado.
  • Joint Venture Spin-offs (JVSOs): o modelo de JVSOs foi apresentado em um artigo de 2004 escrito pelos renomados professores Wright, Vohora e Lockett, do Reino Unido. Nele, os autores apresentam casos britânicos em que o formato de JVSO funciona melhor que Spin-offs independentes em universidades britânicas. Na ideia dos JVSOs, parceiros da indústria entram como investidores com grande participação societária nas spin-offs, alocando recursos financeiros e humanos, rede de contatos e frentes comerciais já estabelecidas pelo seu posicionamento na indústria, garantindo celeridade e alinhamento às demandas do mercado por parte da spin-off. Nesse modelo, os inventores atuam mais como conselheiros/consultores técnicos no time fundador, podendo ainda se dedicar à vida acadêmica e ainda encontrar na spin-off uma via para dar vazão a novas invenções. Apesar disso, diferente do licenciamento, aqui tem-se um time fundador separado do parceiro industrial que garante celeridade e alinhamento de incentivos.

SATTs e a aceleração da transferência de tecnologia

Uma SATT (Société d’Accélération de Transfert Technologique) é um modelo de organização criado na França cujo objetivo é, como já diz o nome, acelerar os processos de transferência de tecnologia das instituições de pesquisa do país. As SATTs atuam como um modelo evoluído dos Escritórios de Transferência de Tecnologia (TTOs) e têm um papel de orquestração de atores do ecossistema, voltado para garantir maior celeridade e efetividade. Elas integram agentes como incubadoras, centros de pesquisa, investidores, agências de desenvolvimento e indústria.

Como dissemos, as SATTs bebem da fonte dos POCCs e das JVSOs, pois seu modelo também conta com uma etapa de centro de prova de conceito e sua visão é mais costurada em parcerias para spin-off do que spin-offs independentes. Do que temos estudado sobre o modelo, o sucesso das SATTs veio com alguns elementos fundamentais:

  • Criação de roadmaps conjuntos com empresas de destaque: em vez de fazer com que cientistas se tornem os próprios empreendedores, as SATTs incentivam o alinhamento de roadmaps dos inventores com startups deep techs que já estão no mercado tendo algum sucesso. A ideia é que as invenções sejam apropriadas por empresas mais ágeis e alinhadas com o mercado, acelerando a possibilidade de sucesso e criando mais orientação ao mercado para inventores ainda em estágio inicial. Isso traz a mesma liberdade dos modelos de JVSOs para os cientistas, assim como aumenta as chances de sucesso da tecnologia e das empresas emergentes.
  • Orquestração por meio de boards cruzados: para garantir o alinhamento entre atores, as SATTs fazem com que os diversos agentes do ecossistema tenham posições cruzadas em seus boards (ex: diretores da incubadora no board da SATT; diretores de centros de pesquisa no board da incubadora). Desta forma, se aceleram os encontros fortuitos e cria-se uma rotina de alinhamento frequente por meio das reuniões de conselho.
  • Maturation fund: a partir de um grande aporte de recursos do governo francês, as SATTs puderam atuar também na frente de investimentos. Pelo que levantamos, os primeiros anos (2006 a 2011) contaram com cerca de 5MM de euros em 45 projetos. Em outras palavras, eram cheques pequenos com o objetivo de “maturation”, ou seja, amadurecer e realizar a prova de conceito das tecnologias. Em 2013, o valor foi de $2,75MM em 14 projetos, e os dados de 2023 indicam que o fundo governamental já atingiu o valor de $856MM. Um fato interessante é que o objetivo é alcançar sustentabilidade financeira: o governo se comprometeu a aportar os recursos, mas o modelo das SATTs deve se tornar lucrativo em uma janela de 10 anos para continuar funcionando.

Em uma imagem de um projeto governamental de 2015 envolvendo a SATT, encontramos o seguinte diagrama que explica melhor (embora em Francês):

SATTs

Para quem quiser saber mais, recomendamos as seguintes fontes:

E agora: vamos fazer no Brasil?

Esse modelo foi uma das descobertas mais interessantes que tivemos nos tempos recentes. Ele junta muitas coisas interessantes que já temos investigado nos últimos anos e os números alcançados atestam que os franceses parecem ter acertado em um formato bastante efetivo. Dado que cada vez mais empresas e governos têm reconhecido a importância de Deep Techs no Brasil, a replicação do formato pode ser uma ação viável de super impacto para a geração de tecnologias que aumentam a competitividade nacional e melhoram a vida das pessoas.

Caso você tenha interesse em replicar o formato no Brasil, que tal batermos um papo para trocarmos mais detalhes em profundidade? É só entrar em contato com o Ricardo Bueno (ricardo.bueno@wylinka.org.br), nosso Gestor de Relacionamentos e Captação.

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Autor: Artur Vilas Boas – Pesquisador na USP em empreendedorismo e inovação (Linkedin)

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