Cosméticos: Como gerar negócios verdes com a edição de genes?
O mercado de cosméticos, cujo valor estimado é de [U$500 bilhões de dólares], vem crescendo ano após ano. Ao mesmo tempo, é um setor altamente dependente de avanços científicos, de P&D e regulamentações, porém também depende de insumos de origem animal e vegetal, e portanto é pouco sustentável, gerando impactos negativos ao equilíbrio do meio ambiente.
Na Wylinka, temos trabalhado com iniciativas de inovação “verde” e acreditamos no seu potencial de mitigar o impacto ao meio ambiente enquanto encanta os usuários. Por isso, resolvemos contar aqui uma frente de inovação nessa área a qual trabalha para produzir ingredientes, até então obtidas apenas a partir do próprio animal ou vegetal, no próprio laboratório por meio da biologia sintética.
Como isso ocorre? Nessa leitura, te contamos tudo 😀
Química sangrenta
A indústria de cosméticos, que vai desde hidratantes até maquiagem pura, possui como maior ativo os compostos produzidos pela natureza, tanto de origem animal quanto vegetal. Além disso, assim como outros setores/industrias, os resíduos dos ingredientes dos produtos, quando descartados causam danos e contaminam a rede fluvial, não apenas prejudicando comunidades como também contribuindo para os altos custos de tratamento da água.
Um exemplo bem conhecido dessa dependência é o ingrediente “esqualeno”, assim como seus derivados, cujas propriedades de hidratação o tornaram o queridinho dos formuladores de cosméticos, embora também seja utilizado em outros setores, como na produção de vacinas. O problema é que grande parte desses compostos são retirados do fígado de uma espécie de tubarões, os quais já sofrem risco de extinção.
Outras formas alternativas para se obter o componente sem sua extração animal direta têm sido exploradas, porém se mostraram pouco eficientes em produzi-lo e isolá-lo, tornando-se pouco atrativas para serem comercializadas no mercado de cosméticos.
Assim como esse ingrediente, outros sofrem com a exploração de animais, como: (i) o colágeno de máscaras faciais, que é retirado das vacas, (ii) queratina utilizada em shampoos, que é retirada de ovelhas, e por aí vai..
Frascos que desmatam
Outro ingrediente muito utilizado no setor é o “azeite de dendê” (ou, em inglês, palm oil), devido às suas propriedade nutritivas e químicas. O azeite é extraído do fruto de uma espécie de palmeiras nativas do oeste da África, com plantações em outros países, pela sua lucratividade.
Entretanto, essa dependência de exploração da mata gera desmatamento, danificando os ecossistemas locais. Um exemplo prático disso é o azeite de rosas, muito utilizado em perfumes: são necessárias 200.000 pétalas para gerar 5mL de perfume.
Empresas de base tecnológica em busca de sustentabilidade
Com o objetivo de diminuir a exploração animal e ter rentabilidade a partir da produção de insumos úteis na indústria, a empresa Amyris produz moleculas, como a de esqualeno, por meio da biologia sintética – os pesquisadores modificam geneticamente leveduras com o gene que a produz, e fermentam os seres vivos com cana-de-açúcar, com o qual se multiplicam rapidamente, para obter as moléculas desejadas com altas eficiências. Tudo o que os pesquisadores precisam é: (i) saber qual o gene que produz tal componente, e (ii) inserir esse gene dentro de fábricas vivas, no caso as leveduras, para que a produzam em larga escala e (iii) ter a cana de açúcar como nutriente dos microrganismos.
Embora a explicação seja simples, na prática é mais complexo, já que depende de tecnologias de edição de genes, como o CRISPR-Cas9. Porém, o importante é que essa tecnologia tem se mostrado muito eficiente e atrativa para grandes marcas, pois para 1km de cana plantada, atinge a produção de cerca de 2000 toneladas de esqualeno, salvando a vida de cerca de 3 milhões de tubarões. A empresa pretende conseguir produzir aproximadamente a metade da diversidade de todas as pequenas moléculas presentes na natureza – um baita impacto. Com tal produção, a empresa comercializa as moléculas a grandes empresas de cosméticos, como a The Ordinary, mas também possuem sua própria marca Biossance.
As empresas Ginkgo Bioworks, que já captou mais de U$800 milhões, e a Evolva, que captou mais de U$120 milhões, produzem perfumes a partir de micróbios desenhados e vendem os produtos a grandes empresas de fragrância mundiais. Embora com grande potencial, ainda não se sabe se a tecnologia tomará o mercado, já que para isso é necessário que grandes quantidades de um ingrediente desejado sejam geradas. É aqui que a edição de genes se diferencia de outras tecnologias ou métodos sustentáveis, pois possui um ponto ótimo entre o custo da tecnologia e os processos para otimizar a eficiência de obtenção dos componentes em larga escala.
Já do outro lado do impacto ambiental, encontram-se o descarte e acúmulo de materiais plásticos decorrentes do uso de cosméticos na natureza. Uma solução para isso tem sido o design de micróbios – por meio da modificação genética via edição de genes – que possam quebrar ou digerir esses plásticos, como a empresa Carbios fez em 2020.
Um dos motivos pelos quais as startups de base científica e de tecnologias específicas, como a edição de genes, serão cada vez mais prevalentes e viáveis comercialmente, nos Estados Unidos, tem nome e sobrenome: Regulamentação Leve – ao contrário do que ocorre na indústria farmacêutica, na qual o risco de regulamentação é alta. Isso ocorre pois a modificação apenas ocorre nos micróbios utilizados como fábricas, ao passo que o produto fabricado, o ingrediente, é igual ao produto natural encontrado na natureza.
Ainda há muito espaço!
De todos os ingredientes utilizados no mercado global de cosméticos, estima-se que 10% são produzidos a partir de micróbios modificados geneticamente, portanto o caminho para diminuir o impacto ambiental ainda é longo – porém, ao mesmo tempo, as oportunidades para novas soluções e negócios de base tecnológicas são muitas.
E se você, pesquisador, pesquisadora, empresa ou universidade, quer transformar pesquisas em tecnologias comercializáveis, não deixe de nos procurar! Temos trabalhado com diversas iniciativas e programas em áreas científicas e tecnológicas diferentes, e atualmente estamos impactando negócios de base tecnológica junto ao Sebrae for Startups.
Mande um email para a gente no (novosnegocios@wylinka.org.br) que a gente cria junto! 😉
Autor: Artur Vilas Boas – Pesquisador na USP em empreendedorismo e inovação (Linkedin)