CES 2022: o que a maior feira de tecnologia nos fala sobre as tendências em Healthtech?
Todos os anos, a Consumer Eletronics Show (ou CES) concentra os lançamentos tecnológicos e eletrônicos de consumo, sendo considerada a maior feira do mundo no setor. Tanto para gestores(as) de programas de inovação quanto para inventores(as) ou inovadores(as), estar a par das fronteiras tecnológicas é um diferencial para entender as dinâmicas de mercado, assim como para a elaboração de estratégias.
Aqui na Wylinka, além de gostarmos muito do assunto, acreditamos no impacto que novas tecnologias possuem (inclusive sempre fazemos a cobertura da feira aqui na Deep, como você pode ler aqui e aqui) e, por isso, trazemos a você algumas soluções que chamaram nossa atenção no setor da saúde. Afinal, sem saúde, nada podemos fazer.
Peças Domésticas Inteligentes (ou Monitoramento de Sinais Dentro de Casa)
Temos visto uma grande quantidade de smartwatches e anéis capazes de medirem sinais biológicos como os batimentos cardíacos (inclusive, na própria feira, foi apresentado mais um anel inteligente: o Circular Ring). Porém, um produto inusitado para a mesma finalidade foi lançado na CES: a Sengled, uma lâmpada inteligente. Parece ser impossível, mas a tecnologia utiliza inteligência artificial para captar dados biológicos do usuário, como batimentos cardíacos, temperatura corporal e, até mesmo, a qualidade do sono, e depois envia as informações armazenadas ao usuário por meio do seu aplicativo.
Outro produto nesse cenário foi o BBalance, um tapete inteligente o qual planeja captar informações de peso e composição corporal, postura e balanço uma vez que o usuário se posicione sobre ele. O tapete, então, envia os dados a um aplicativo e oferece exercícios personalizados para a correção da postura, assim como dicas de hábitos alimentares. E aqui vai uma feature bem legal: o tapete é capaz de reconhecer as pessoas pela própria pegada! Ou seja, o usuário não precisa acessar uma conta para informar ao tapete que está se posicionando nele – o produto capta a informação a partir de sua pisada.
Já não tão inusitado, mas com uma tecnologia e impacto interessante foi o travesseiro Motion Pillow 3. Desenvolvido para usuários que possuem ronco crônico, o travesseiro inteligente detecta, grava e analisa os padrões do ronco.
A detecção do som faz com que bolsas de ar dentro do travesseiro se inflem ou se ajustem para melhorar a posição da cabeça a fim de diminuir ou cessar o ronco do usuário. Tudo isso de uma forma que não perturbe o sono, através de sensores de pressão.
O bacana é que o produto realiza um acompanhamento da qualidade do sono do usuário por meio de um aplicativo. Além disso, o travesseiro auxilia indivíduos que apresentem risco de terem problemas de saúde mais sérios, como a apneia do sono obstrutiva.
Integração da Cadeia de Cuidado
Uma tendência intensificada com os efeitos biológicos da Covid-19 é o monitoramento da saúde cardiovascular. Nesse sentido, outras soluções que tiveram destaque na CES –por integrarem o monitoramento de sinais com um serviço de acompanhamento médico – foram os serviços de monitoramento remoto de pressão arterial e frequência cardíaca da Omron Healthcare e da Withings.
Essas empresas, além de oferecerem os dispositivos para monitoramento, mostraram seu diferencial no compartilhamento dos dados vitais do paciente com as equipes médicas, por meio do armazenamento e envio dos dados por um aplicativo no próprio celular do usuário. Além de usarem a inteligência artificial para prever possíveis eventos de risco.
Soluções como essas possuem grande impacto, pois abarcam problemas muito prevalentes no mundo todo como o da hipertensão e condições cardiovasculares.
Saúde Metabólica em Expansão
Cada vez mais, o ser humano se preocupa com o que deve ou não comer (ou quando deve fazê-lo), seja devido a condições de saúde pré-existentes ou, a interesses por performance física e estilo de vida.
Nesse contexto, uma tecnologia que tem sido explorada por algumas empresas, dado ao seu impacto no controle glicêmico de indivíduos diabéticos, é o dispositivo de monitoramento de glicose. Na CES, a empresa Abbott apresentou seu sensor de glicose, o qual uma vez em contato com a pele, realiza a medição sem a necessidade de qualquer picada na pele. Ele também projeta tendências a partir dos dados armazenados em aplicativo de celular.
Indo mais além, a empresa também informou no evento que está desenvolvendo um novo dispositivo, chamado Lingo, o qual promete fazer a detecção contínua de outros indicadores de saúde metabólica além da glicose, como cetonas e lactatos, e até mesmo os níveis de álcool. Isso permitirá que o usuário gerencie melhor sua saúde, nutrição e seu desempenho físico.
Nessa mesma tendência de cuidados com a saúde metabólica, um produto que chamou a atenção foi o Avokadio. Criado por um engenheiro eletrônico e uma pesquisadora em nutrição o dispositivo coleta informações a partir do hálito do usuário e, então, indica dietas e bons hábitos nutricionais personalizados em um aplicativo, por meio do uso de inteligência artificial.
Além disso, a solução conta com um plano de acompanhamento semanal de mentoria nutricional. Fica a dica: nutrição personalizada é o futuro.
Simplificação de Diagnósticos Neurológicos
A área neurológica é uma das áreas mais custosas e complexas no cuidado da saúde já que, de forma geral, não dispõe de abordagens, processos e tecnologias simples no manejo ao paciente. A detecção de doenças neurológicas, por exemplo, demanda grandes maquinários, recursos humanos e financeiros ao sistema hospitalar, e aqui algumas tecnologias marcaram presença e prometeram benefícios significativos.
Novamente a Abbott apresentou o primeiro teste rápido e portátil de traumatismo cranioencefálico (TCE) do mundo, o qual poderá auxiliar a equipe médica na avaliação de indivíduos com suspeita de TCE em apenas 15 minutos. A detecção é feita por meio da análise de biomarcadores presentes no sangue do indivíduo testado.
A proposta do produto é ajudar a eliminar o tempo de espera em salas de emergência, além de diminuir a necessidade de execução de tomografias em até 40%, representando uma diminuição considerável de gastos hospitalares. Para se ter uma ideia, cada tomógrafo custa em torno de R$ 2.6 milhões de reais.
Na área da neurologia, a empresa sul coreana iMediSync lançou um capacete para detecção e análises com poder preditivo de diversas condições neurológicas (como demência, a doença de Alzheimer, sintomas da depressão, transtornos de ansiedade, doença de Parkinson) em apenas 10 minutos. A ideia aqui é facilitar o diagnóstico precoce dessas condições, o que melhoraria a eficácia dos cuidados e tratamentos posteriores.
Na mesma linha de dispositivo, a empresa Megnosis Co. também de origem sul coreana, apresentou seu protótipo de capacete detector de duas condições mentais: demência e depressão. O diferencial apresentado por eles é que o produto contém um potencial terapêutico, ou seja, é capaz de diminuir o declínio cognitivo, além de aliviar os sintomas da depressão.
Em suma: Sorria, você está sendo monitorado!
A CES mostrou que o futuro da saúde é: (I) Democratizado, pois permite que usuários sem, ou com menores, condições de acesso a centros hospitalares possam gerenciar sua saúde remotamente. (II) Descentralizado, pois o usuário tem acesso a soluções e serviços antes somente oferecidos dentro de estabelecimentos hospitalares. Além disso, ao se tornar a primeira pessoa a ter conhecimento de seu estado de saúde, o usuário possui maior poder de decisão sobre o mesmo. (III) Digitalizado, pois é visto um avanço de soluções, sejam produtos ou serviços, que se integram a aplicativos e plataformas digitais a fim de armazenamento, acompanhamento e tratamento de dados para a obtenção de insights
Uma marca forte da feira foi a utilização de peças domésticas a favor do mapeamento e acompanhamento da saúde e o bem-estar do usuário. E, independente do tipo de dispositivo e área de saúde, a CES mostrou que o usuário deverá deter maior conhecimento de sua saúde geral. Aqui, o conhecimento não é apenas poder; é uma carta que forçará o indivíduo a ser mais (pro)ativo e menos passivo e (re)ativo quanto a sua saúde.
Será interessante ver o quanto essas tecnologias permearão o ciclo de cuidado real de uma pessoa, servindo como interface entre o agente hospitalar/de saúde e o paciente, e ainda permitindo um olhar mais completo e longitudinal ao indivíduo. Um pequeno exemplo dessa tendência é o surgimento de gestoras (e não mais planos) de saúde com mais olhar de prevenção do que de remediação, além de times de saúde disponíveis 24h aos usuários.
Autor: Artur Vilas Boas – Pesquisador na USP em empreendedorismo e inovação (Linkedin)