Sobre as oportunidades de investimento em Ciência e Tecnologia no Brasil
Sobre as oportunidades de investimento em Ciência e Tecnologia no Brasil
Nesse texto Ana Calçado, diretora presidente da Wylinka e Maria Carolina Rocha, CEO da ABGI no Brasil, compartilham suas visões e experiências no apoio às empresas e instituições de ciência e tecnologia para trazer um panorama sobre as oportunidades da ciência e tecnologia no Brasil. A ABGI é uma consultoria pioneira na gestão estratégica dos recursos financeiros e processos para inovação para grandes empresas, com atuação direta e indireta em 13 países ao redor do mundo. Boa leitura!
Desde o Projeto Manhatan e sua bomba atômica ficou evidente que ciência pode definir a ordem de poder mundial. Apesar da força desse poder destrutivo, estamos aqui focando no poder vindo do crescimento que a ciência pode proporcionar.
As pesquisas de Robert Solow na década de 50 já indicavam que mais da metade do crescimento americano tinha origem na tecnologia e inovação. Na década de 90, Paul Romer continuou afirmando que “o crescimento é guiado pela mudança tecnológica”. A mesma lógica vale para as empresas, que observam cada vez mais seu nível de competitividade ser definido pela sua capacidade de antecipar e se adaptar às rápidas mudanças de cenário.
Nesse cenário, a ciência e tecnologia produzida na academia pode ser uma forte aliada das empresas na jornada em busca de um lugar ao sol no novo contexto mundial. E para aproveitar esta oportunidade é necessário ousar enfrentar mais incertezas e adaptar mindsetsinternos para absorver o novo. Queremos mostrar que as empresas brasileiras estão em posição privilegiada para isso. Não só pela qualidade técnica das instituições de pesquisa e infraestrutura para pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I) do país, mas também pelo amadurecimento da política nacional de ciência, tecnologia e inovação (CT&I), e pela disponibilidade de instrumentos de fomento à inovação.
1. Produzimos ciência de ponta
A ciência no Brasil se destaca pela qualidade das instituições de pesquisa e ensino, volume de publicações e relevância na pesquisa de algumas áreas como saúde, agricultura, biodiversidade, TICs, entre outras (IPEA, 2016). A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), por exemplo, é a instituição que mais publicou na área de Medicina no mundo, sendo 30% destas pesquisas em cooperação internacional. Existe na Fiocruz um forte direcionamento para a geração da inovação em saúde, como pudemos conhecer no projeto de transferência de tecnologias em que a Wylinka foi parceira (https://wylinka.org.br/transferencia-tecnologias-avaliacao-fiocruz-gestec/).
2. Temos Infraestrutura para pesquisa e desenvolvimento tecnológico
Temos uma vasta infraestrutura de pesquisa, como demonstrado pelo Ipea em estudo de 2013 sobre as instituições do MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações), que identificou 196 laboratórios distribuídos em 25 unidades de pesquisa, atuando em diferentes áreas das engenharias e das ciências exatas e da terra, biológicas, agrárias e da saúde. Um exemplo de grandes infraestruturas laboratoriais é o Sirius, do Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais (CNPEM), uma das primeiras fontes de luz síncrotron de 4ª geração do mundo.
Trata-se de uma sofisticada infraestrutura de pesquisa aberta e multidisciplinar que é ferramenta-chave para a resolução de questões importantes para as comunidades acadêmica e industrial brasileiras, permitindo o desenvolvimento de pesquisas em áreas estratégicas, como energia, alimentação, meio ambiente, saúde, defesa e vários outros. Temos na área de nanotecnologia o Sistema Nacional de Laboratórios em Nanotecnologias (SisNANO), formado por 26 laboratórios direcionados a PD&I em nanociências e nanotecnologias, com acesso aberto para usuários dos setores acadêmico e empresarial. Outra infraestrutura importante são os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT), que apoiam projetos em todo o País cujos resultados têm forte impacto no desenvolvimento científico e tecnológico e na modernização produtiva.
3. Possuímos programas que catalisam a inovação
Dentre as estruturas criadas para catalisar a inovação, temos a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), cuja missão é apoiar projetos empresariais que tenham como base a inovação por meio da cooperação universidade-empresa, utilizando-se de mecanismos ágeis e transparentes de contratação e fomento às atividades de PD&I. Com objetivos similares e uma atuação mais descentralizada, o Sistema Brasileiro de Tecnologia (Sibratec) também atende empresas por meio de mais de 400 ICTs.
4. Estamos construindo um ambiente regulatório promissor
Ações de melhoria do ambiente para interação entre academia e empresas estão sendo realizadas no âmbito do Marco Legal de Inovação, que prevê a diminuição dos entraves burocráticos e mais liberdade para a pesquisa científica, por meio da simplificação de processos diversos e do incentivo à integração de empresas privadas ao sistema público de pesquisa. Falamos sobre o tema no texto escrito pela Carolina Fountoura. Ações como o Global Innovation Policy Accelarator (GIPA), no qual somos parceiros do Nesta no Brasil, ajudam a criar ambientes para aplicação prática destes novos instrumentos. No programa realizado este ano, que tem como objetivo a criação de espaços de experimentação para a aceleração de políticas de inovação por agentes públicos, dois dos projetos trabalhados tinha como tema a interação universidade-empresa.
Apesar da capacidade, estrutura e ambiente favoráveis, o atendimento das demandas do setor produtivo ainda é incipiente, o que contribui para o gap na geração de inovação, como demonstrado pelo baixo volume proporcional de patentes. Um dos principais desafios é o investimento no desenvolvimento de soluções a partir da academia. O GII 2019 (Global Innovation Index) mostra uma tendência de queda nos gastos públicos em P&D em todo o mundo e, por outro lado, as empresas têm dificuldade em financiar o estágio inicial ou a tecnologia altamente disruptiva.
Esse dilema impacta também a capacidade de os spin-offs acadêmicos se tornarem empreendimentos sustentáveis. Eles se tornam dependentes de capitalistas de risco, que tendem a promover o crescimento financeiro de curto prazo e tem uma compreensão incompleta dos desafios e necessidades deste tipo de negócio. Há, portanto, a necessidade de abordagens inovadoras de financiamento, especialmente nas fases mais precoces e arriscadas da pesquisa.
5. Disponibilidade de instrumentos de fomento à Inovação
A realização das atividades de ciência e tecnologia está diretamente relacionada à incertezas e riscos, além da necessidade de recursos financeiros. Nesse sentido, o poder público, agente responsável pela indução de políticas de promoção e incentivo ao desenvolvimento científico, a pesquisa e a inovação, tem um importante papel de criar medidas e instrumentos de fomento a essas atividades. Esses instrumentos são vistos como uma forma de compartilhar e reduzir os riscos inerentes ao desenvolvimento de soluções inovadoras, além de favorecer a formação de parcerias de PD&I entre empresas, universidades, centros de pesquisas e startups.
Nesse contexto, a ABGI estruturou um Mapa de Fomento, conforme abaixo, que visa sumarizar os principais tipos de instrumentos de apoio à inovação disponíveis no país. Esses podem ser segregados como: (1) apoio indireto: aqueles que se dão por meio da redução da carga tributária, por exemplo, os incentivos fiscais da Lei do Bem, da Lei de Informática e do Rota 2030; (2) apoio direto, ou seja, instrumentos financeiros às atividades de PD&I, como os programas, Inova Talentos (bolsas), Finep Inovação (recursos reembolsáveis com taxas de juros mais atrativas) e Embrapii (recursos não reembolsáveis para projetos em parceria com ICT e empresas); (3) como já mencionado anteriormente, outras formas de apoio previstas no Marco Legal de Inovação, em que o poder público visa promover e facilitar o relacionamento entre o ambiente público e privado.
Para que as empresas e instituições de pesquisa possam se manter atualizadas quanto mecanismos de apoio, inclusive aqueles destinados a fomentar a parceria entre ambas, é importante o constante monitoramento das oportunidades, além da aproximação junto aos órgãos de fomento para melhor alinhamento sobre as premissas e condições de acesso aos instrumentos.
Podemos perceber um amadurecimento do ecossistema de inovação no Brasil, hoje melhor preparado para fomentar e estimular que a ciência e tecnologia desenvolvida na academia chegue efetivamente ao mercado. Por outro lado, os desafios se tornam mais complexos e, pra sobreviver e se destacar, as organizações precisam ser ousadas, ágeis, trabalhar em rede, além de buscar uma visão estratégica de captação de recursos financeiros públicos e privados.
Autoras: Ana Carolina Calçado, Diretora-Presidente na Wylinka e Maria Carolina Rocha, CEO na ABGI Brasil