Comportamento Empreendedor

Note taking hacks: Criando um sistema de anotações pessoais.

26/abril/2019

Note taking hacks: Criando um sistema de anotações pessoais.

Diferente de outros textos da Wylinka, este texto terá um teor mais pessoal — será escrito em primeira pessoa por mim, Artur (responsável pelos conteúdos por aqui), por ser um compartilhamento dos meus hábitos no tomar notas de tudo que vivencio. É bom que serve também como um experimento para que nossos produtores de conteúdos também possam escrever dessa forma (ou não, caso dê errado). Para quem não sabe, a Wylinka é uma Organização Sem Fins Lucrativos que faz projetos voltados ao desenvolvimento de ecossistemas de empreendedorismo e inovação no Brasil — já fizemos coisas como (i) cuidar da execução das primeiras rodadas do SEED-MG; (ii) ser o responsável nacional por um programa aceleração de políticas públicas do Brasil com o National Endowment for Science Technology and the Arts (NESTA) do Reino Unido; (iii) além de muitos, mas muitos, projetos com universidades brasileiras envolvendo avaliação de patentes, criação de startups e desenho de programas de ensino de empreendedorismo. Para conhecer melhor, nosso site: www.wylinka.org.br

Contexto

Como acadêmico e produtor de conteúdo, estou sempre consumindo materiais — sejam artigos web, papers científicos, palestras, cursos, disciplinas e outros — e manter esse volume de informações organizado não é trivial. Nos últimos anos, tentei estudar algumas práticas de anotação e comecei a desenvolver um sistema bastante funcional de anotações. Após muitos amigos me pedindo dicas, resolvi formatar os aprendizados neste post para mais pessoas terem acesso. Um ponto importante: quando eu falo de “sistema de anotações pessoais” é porque isso envolve a ferramenta/meio (papel ou digital), as rotinas (como e quando escrever) e as boas práticas de categorização e organização dos conteúdos.

O uso de cadernos de notas tem, para mim, algumas funções: (i) sedimentar conhecimentos; (ii) exercitar a organização e hierarquização de narrativas; (iii) facilitar o resgate de informações quando necessário. Para alguns, e isso acontece mais quando estou registrando digitalmente, o processo de anotar é o processo de pensar em si — ou seja, o pensamento vai surgindo ao passo que você vai anotando/digitando (o que meu orientador chama de “pensar com os dedos”). Richard Feynman era defensor disso, e esse diálogo dele é super legal:

When historian Charles Weiner looked over a pile of Richard Feynman’s notebooks, he called them a wonderful ‘record of his day-to-day work’.

-“No, no!”, Feynman objected strongly. “They aren’t a record of my thinking process. They are my thinking process. I actually did the work on the paper.”

-“Well,” Weiner said, “The work was done in your head, but the record of it is still here.”

-“No, it’s not a record, not really. It’s working. You have to work on paper and this is the paper. Okay?”, Feynman explained.

Photo by The Climate Reality Project on Unsplash

Um overview dos sistemas utilizados por alguns pensadores

Para chegar no meu sistema pessoal de notas, fui pegando algumas boas práticas de diversas pessoas e isso me ajudou a modelar o que melhor funciona para mim. Vou apresentar brevemente alguns modelos para que você personalize seu formato da melhor maneira também:

  • Ed Boyden (um dos maiores neurocientistas da atualidade, professor do MIT): organiza as notas dele digitalmente; sempre que está em uma reunião, escreve as notas em um pedaço de papel e, no fim da conversa, tira uma foto da nota pelo celular e entrega o papel para a pessoa; mensalmente faz uma revisão dessas anotações e vai organizando-as no computador utilizando keywords, pois isso permite realizar buscas futuras. Para aprofundar: How To Think, According To This Winner Of The Brain Prize.
  • Stephen Wolfram (criador do Wolfram Alpha): em um texto de mais de 1h de leitura, o Wolfram apresenta uma obsessão por organização e produtividade — com todos os hacks possíveis para tornar cada minuto mais útil para programar e gerenciar sua empresa. Ele sempre anda com um papel avulso no bolso e uma caneta, anotando as coisas de maneira mais descompartimentalizada de modo a permitir organização futura. A premissa é que, se você anda com apenas um caderninho, pode acabar tendo anotações com temas distintos no mesmo local e se perdendo depois. Depois ele categoriza tudo em pastas (ele tem gavetas de arquivos) com tópicos mais abertos: segundo ele, é melhor você perder alguns minutos navegando por muitas notas em um compartimento mais abrangente do que se perder lembrando das subcategorias que você foi criando. Para aprofundar: Seeking the Productive Life
  • Niklas Luhmann (sociólogo alemão que publicou mais de 60 livros e 600 papers): leituras matinais seguidas de pequenas notas, menos de uma linha cada, que iam acumulando ao longo do dia. No fim da tarde, parava para refletir sobre as mesmos escrevendo mini-ensaios que fossem inteligíveis para sempre. Com essa organização futura, separava em (i) materiais exploratórios/aleatórios; (ii) materiais permanentes para aprofundar; (iii) materiais com relação a projetos específicos. Com o tempo, aprofundava em temas que se acumularam para reflexões mais profundas, como conectar com outras ideias, buscar contraexemplos, buscar por princípios fundamentais etc. Para aprofundar: The Art of Taking Notes.

Meu sistema pessoal

O primeiro ponto é que prefiro fazer usando papel e caneta — me permite concentrar naquela tarefa exclusiva e parece ser mais produtivo para a organização de pensamentos soltos. Como destacado em uma excelente matéria do New York Times: “With handwriting, the very act of putting it down forces you to focus on what’s important,” he said. He added, after pausing to consider, “Maybe it helps you think better.”. Tenho também um arquivo digital que me ajuda a anotar ideias rápidas pelo celular mesmo. Esse registro ajuda a “aliviar” meu cérebro por não ficar precisando lembrar das coisas — elas estão sempre registradas em algum lugar (essa técnica se chama brain dumping).

Segundo, tenho cadernos diferentes para temas diferentes: um de reuniões, um de vida pessoal, uns para projetos específicos, um para programação. Nesse ponto ainda uso os tradicionais moleskine, mas isso acaba gerando um volume de cadernos muito ruim. Tenho feito uma transição para o modelo de Midori, que é uma capa que permite adicionar pequenos “refis” de cadernos temáticos, permitindo que você ande com menos volume e possa trocar de temas a serem organizados posteriormente. Além disso, a lógica do Midori permite personalizar com bolsos e muitas outras coisas, sendo super famoso fora do Brasil. Um amigo meu super produtivo, o Átila, do Nerdologia, usa e é o que salva ele na organização de temas e categorias. Esse vídeo explica bem o Midori (e no Elo7 você encontra modelos diversos pra comprar): https://www.youtube.com/watch?v=XCyvSPDMnBw

Quando faço minhas viagens de pesquisa para fora do Brasil, levo pastas com folhas A4 para anotações mais robustas (e geralmente os materiais que coleto por lá são arquivos em A4), colocando em uma pasta dividida pelos países (ou universidades).

Tento ter rotinas mensais de organização de cadernos — especialmente de reuniões e aulas. Isso me permite mandar um email para a pessoa da reunião ou aula com uma mensagem — “se eu entendi bem, o tópico é…”. Isso me força a organizar os pensamentos de maneira clara e concisa, além de validar com o interlocutor se o conteúdo está correto — e essa é uma ótima forma de aprofundar relacionamentos. Para essa revisão, eu tenho alguns códigos nas minhas anotações: asteriscos são para pesquisar depois, @ são para nomes de pessoas que tenho que conhecer/estudar. (alguns amigos usam “!” para tópicos importantes e outros símbolos para insights). Como o Wolfram coloca, o segredo é não criar muitas subcategorias para não se perder depois.

Para sedimentação, também exploro o hábito de publicar meus aprendizados: seja em posts no Linkedin, em textos aqui na DEEP ou com alunos na USP. Aqui segue um pouco do que eles chamam de “técnica Feynman de aprender” — anotar o nome do conceito em um papel; escrever a explicação do conceito como se você estivesse explicando para alguém; destacar os pontos que você sentiu mais dificuldade para explicar e revisar em estudos aprofundados; simplificar a explicação à sua forma mais enxuta. Explicar para os outros de forma breve é um excelente exercício. E é bom que espalha o conteúdo. 🙂

Outros horizontes

Alguns novos formatos têm surgido para facilitar as coisas, tais como:

  • Notion: um produto maravilhoso para gestão de anotações pessoais, sendo um grande Evernote killer. Ele permite organizar em tópicos diversos com um layout intuitivo e bonito, além de oferecer o compartilhamento da nota com um clique como se fosse um blog post. Ele é gratuito e multiplataforma (sendo o lugar onde organizo ideias rápidas e projetos maiores, por exemplo), mas com esse meu link você ganha 10 dólares de crédito para testar 2 meses no modelo pago (e eu ganho 5! =D). Depois de adotar o Notion, minha escrita ficou bem mais produtiva — o visual e a experiência do usuário realmente ajudam.
  • Cadernos físicos com interface digital: algumas pessoas estão propondo modelos que utilizam a interface física dos cadernos, mas com modelos de sincronização com aplicativos e scanners. É o caso do pessoal da WhiteLines (que usa linhas brancas que somem quando escaneado) ou do Everlasting Notebook (que usam um plástico lavável, como um quadro branco, e uma interface de escaneamento e categorização já no papel). Acho que esses modelos em uma estrutura de Midori seriam matadores 🙂

Resumindo

Criar um sistema de notas é algo bem pessoal e o sistema vai se construindo ao passo que você vai testando as possibilidades — não adianta planejar mil categorias e mil estratégias, comece do básico e vá testando algumas práticas que fazem sentido para você. O segredo está nos três pilares: meios, códigos e ritos. Os meios são as ferramentas (papel solto, caderno, digital etc.), os códigos são as categorias e padrões de organização e os ritos são as rotinas de revisão e organização. O importante é criar um sistema que te ajude a (i) não perder boas ideias e insights, (ii) organizar de maneira acumulativa para gerar cruzamento e identificação de padrões, (iii) categorizar permitindo acessar sempre que precisar. Além desses cadernos, eu tenho meus hábitos de to-do e habit tracker, mas sobre isso eu já falei nesse post aqui.

Espero que tenham gostado! Qualquer coisa é só me mandar uma mensagem no Linkedin!

Tomara que seja útil pois, como sempre falamos na Wylinka, when you rock, #Wyrock!

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