Quando a Inovação e a Acessibilidade se unem
Confira como a inovação está sendo usada para proporcionar a acessibilidade e melhorar a vida das pessoas com deficiência
Quantas pessoas com deficiência existem no Brasil hoje? Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2022 mostram que a população com deficiência no Brasil foi estimada em 18,6 milhões de pessoas. Além disso, para além dos 4 tipos de deficiência – visual, física, neurodiversidade/intelectual e auditiva – também temos contextos de deficiência nos quais elas podem ser permanentes, temporárias e situacionais/momentâneas.
Diante dessa diversidade, a acessibilidade tem se tornado um tema urgente em nossa sociedade, que precisa cada vez mais estar em debate, especialmente quando falamos de inclusão social e da transformação positiva das vidas das pessoas. No epicentro desse movimento, estão as inovações tecnológicas, que se mostram como ferramentas promissoras para derrubar barreiras e viabilizar ambientes e sociedades mais acessíveis.
Neste artigo, convidamos você a explorar conosco e com o Thierry Marcondes, Conselheiro e Construtor de Conexões de Impactos e Modelador de Negócios Futurísticos, a conexão entre inovação e acessibilidade. Então, pegue um café e vamos lá!
Inovação, Tecnologia e Acessibilidade
A evolução tecnológica tem desempenhado um papel fundamental na construção de um mundo mais inclusivo. Por meio de soluções inovadoras, tem sido possível transformar a vida de pessoas com deficiência, proporcionando a elas uma maior independência e participação ativa na sociedade. Nesse contexto, destacamos três exemplos de tecnologias que estão redefinindo os limites da acessibilidade:
- Reconhecimento de Voz: Ampliando Horizontes
Um dos avanços tecnológicos mais notáveis é o desenvolvimento de softwares de reconhecimento de voz. Essa inovação tem se mostrado uma verdadeira revolução para pessoas com deficiência visual ou motora, eliminando as barreiras tradicionais de digitação e uso do mouse. Imagine a liberdade de se comunicar e utilizar dispositivos tecnológicos através da voz.
Um exemplo é o software Motrix, criado pelo Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Esse programa inteligente permite que indivíduos com deficiência motora severa, incluindo tetraplegia e distrofia muscular, possam não apenas acessar a internet, mas também escrever, ler e interagir com o mundo digital. Comandos verbais ativam funções no computador, capacitando essas pessoas a explorar um novo mundo de possibilidades.
- Mapeando a Acessibilidade
Outra tecnologia criada em prol da acessibilidade é o aplicativo Guia de Rodas, criação de uma startup brasileira de mesmo nome. Esse aplicativo vai além da conveniência, sendo uma ferramenta poderosa para pessoas com dificuldades de locomoção. O Guia de Rodas mapeia locais que oferecem estruturas acessíveis para cadeirantes e indivíduos com mobilidade reduzida. Usuários cadastrados podem avaliar estabelecimentos em termos de acessibilidade, permitindo que todos possam tomar decisões informadas sobre onde ir e desfrutar de suas atividades. Esse aplicativo não apenas facilita a vida daqueles com deficiência, mas também promove uma mudança cultural, incentivando a conscientização e a adaptação para criar ambientes mais inclusivos em todo o mundo.
- Inovação nos detalhes
A inovação tecnológica também está se estendendo a áreas inesperadas, como a criação de um cubo mágico especialmente projetado para pessoas com deficiência visual. Tradicionalmente visto como um desafio intelectual, o cubo mágico agora se torna um veículo de exploração tátil. Este cubo apresenta texturas distintas em suas faces, permitindo que pessoas com deficiência visual resolvam o quebra-cabeça por meio do tato. Essa abordagem criativa não apenas proporciona entretenimento, mas também estimula o raciocínio e oferece uma experiência inclusiva.
Com a palavra, o especialista
Num mundo movido pela tecnologia, esses exemplos representam apenas um fragmento do que é alcançável. Neste contexto, Thierry Marcondes conversou com a gente sobre o cenário atual da conexão entre inovação e acessibilidade, além de abordar as perspectivas para o futuro.
Thierry é um empreendedor apaixonado por inovação. Formado em Engenharia Mecânica, ele é fundador e mentor de startups. Surdo, ele aprendeu a falar português, inglês e espanhol por vibração, tocando nas pessoas e fazendo leitura labial. Atualmente é Linkedin Creator, Conselheiro e Construtor de Conexões de Impactos e Modelador de Negócios Futurísticos. Confira um pouco da nossa conversa:
- De que forma as inovações estão reconfigurando o cotidiano das pessoas com deficiência?
Na verdade, vejo que as inovações estão reconfigurando/ mudando o contexto de todos. Temos percebido que trabalhar com os extremos abarca tudo e abrange todos. Isso pouca gente fala, fomos ensinados no mercado a focar em “personas”, esse é um novo conceito e forte para a diversidade. Além disso, é uma solução super escalável. Se as pessoas entenderem isso, compreenderão que não se trata apenas de acessibilidade estrutural, como implementar rampas, mas sim de considerar a experiência do usuário.
Configurar uma rampa, por exemplo, não só melhora essa experiência para pessoas com cadeira de rodas ou muletas, mas também para quem carrega malas, empurra carrinhos de bebê, entre outros. Por exemplo, você percebe que em um ambiente que tem rampa ou escada, na maioria das vezes, as pessoas optam pela rampa. Todos podem usufruir de maneira mais agradável.
Portanto, não se trata mais de inovar primeiro e depois incluir. As empresas perceberão que inovar com acessibilidade traz uma nova dimensão de experiência e novas formas de realizar tarefas, envolvendo a todos de maneira escalável. Falo que existem 4 pilares de acessibilidade: acessibilidade de usabilidade, de comunicação, de disponibilidade e acesso/ recurso.
- Como a tecnologia e a acessibilidade estão interligadas?
Tem tudo a ver. Eu digo que para incluir uma pessoa, existem duas coisas que precisam ser feitas: você precisa do apoio da família e da sociedade – esses são os aspectos culturais. E ao mesmo tempo, precisa dos aspectos tecnológicos, como os dispositivos e a tecnologia. Enquanto as pessoas continuarem a separar essas coisas, enfrentarão dificuldades.
“Ah, mas acessibilidade é apenas uma impressora braille?” (por exemplo). Olhe bem: o teclado do computador foi uma invenção para incluir cegos na escrita. Veja como todos o utilizam e quantos de vocês, mesmo não fazendo curso de datilografia, já se pegaram digitando sem olhar para o teclado.
Outra inovação que nasceu da acessibilidade, o corretor ortográfico (desenvolvido por um surdo), foi criado para ajudar surdos a escreverem melhor. Veja como todos o utilizam. Quem não passou mico até por confiar demais? E olha como ele evoluiu no Gmail, por exemplo. Quando você escreve no início “Boa”, ele já sugere “Boa noite”. Já vai completando, vai ajudando na escrita com os padrões. Estamos até evoluindo para um ChatGPT ou o Bard, que vão além de corrigir os textos, propondo sugestões de acordo com o que você quer.
Quando um ambiente é mais agradável, ele se torna altamente acessível. Considere o exemplo do Macbook: você nem precisa usar o mouse. É uma experiência agradável desde o início, porque foi projetado pensando na acessibilidade. E isso é apenas um exemplo. Tenho mapeado quase 41 invenções que foram desenvolvidas por pessoas com deficiência ou pensando na acessibilidade, as quais estão presentes no nosso dia a dia. Portanto, a acessibilidade deveria estar mais voltada para a experiência do usuário e integração, reduzindo os problemas técnicos. Isso ajuda a incluir muito mais pessoas.
- Enquanto a tecnologia prossegue em sua evolução, emergem novas oportunidades para fomentar a inclusão social. Contudo, também nos deparamos com desafios nesse trajeto. Para você, quais são os principais obstáculos que enfrentamos ao buscar tornar a sociedade mais acessível por meio da tecnologia? E de que modo podemos ultrapassá-los?
Hoje enfrentamos dificuldades para perceber a conexão entre tecnologia, acessibilidade e inclusão (e até impactos). Isso ocorre em grande parte devido à escassez de oportunidades concedidas a grupos minoritários. Estou me referindo não somente a pessoas com deficiência. Por exemplo, estou lendo um livro chamado “Mulheres Invisíveis”; fala sobre os projetos dos celulares, que foram feitos pela mesma equipe de engenharia, muitas vezes formada por homens brancos. Isso acaba resultando no tamanho dos celulares, o que causa mais dificuldades para as mulheres digitarem, levando à necessidade de outros acessórios, como um prendedor que é colocado na parte de trás do celular.
Portanto, se nós já incluirmos e proporcionarmos oportunidades desde o início, abrangendo a participação de todos no projeto, poderemos contemplar mais aspectos para tornar a sociedade mais acessível usando a tecnologia.
O primeiro passo é convidar a participação e, acima de tudo, oferecer oportunidades. Claro que existe uma maneira de escalonar isso. Tenho uma metodologia que criei chamada 5Is que aborda como trocar Informações, como Inspirar, como Incluir para Inovar e gerar Impacto. Contudo, o ponto de partida é convidar todos a se unirem, formando um coletivo de desenvolvimento.
Quantas vezes você perguntou a uma pessoa o que ela precisa? Quantas vezes você foi a inspiração para que uma pessoa se sentisse pertencida e confiasse no processo, e para ser de fato incluída? Ao fazer isso, você começará a perceber, com base em diferentes perspectivas de mundo e nos problemas enfrentados por essas pessoas, que as soluções serão construídas de maneira mais escalável.
A ciência muda o mundo
Na Wylinka, essa crença na transformação social por meio da inovação científica e tecnológica se reflete em nossos esforços. Através de uma abordagem intencional e direcionada, almejamos não apenas converter tecnologia em inovação, mas também moldar positivamente o cotidiano das pessoas. Olhamos adiante, visualizando a oportunidade de coconstruir um futuro inclusivo e equitativo, no qual cada indivíduo assume o protagonismo de sua própria jornada. Essa visão nos impulsiona a desenvolver políticas de acessibilidade, a compreender as necessidades dos participantes em nossos projetos e a colaborar com parceiros comprometidos com a promoção da diversidade.
Quer nos ajudar nessa jornada? Vamos conversar!
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