Investindo em Startups

Fellowships: estimulando Deep Techs com o ingrediente certo – tempo.

21/maio/2024

Já não é novidade que nossa missão aqui na Wylinka é transformar o conhecimento científico em inovação que gera impacto na sociedade, e por isso estamos constantemente em busca de novos mecanismos para tal missão. Aqui na Deep, por exemplo, já apresentamos diversos formatos que consideramos legais – como as sociedades de aceleração de transferência de tecnologia, os translational programs, entre outros. No texto de hoje, traremos uma nova descoberta recente das nossas pesquisas, e esperamos que seja mais uma possibilidade para quem compartilha dessa mesma missão que nós.

“O processo é lento…”

Como já discutimos em outros textos, o estímulo à inovação e empreendedorismo em universidades brasileiras não é trivial por uma série de motivos. Primeiro, arranjos regulatórios, como regimes de dedicação exclusiva ou complexidades para colaboração universidade-empresa, criam uma mentalidade de que o cientista não pode sair tanto dos muros da academia. Segundo, as lógicas acadêmicas tendem a ser mais avessas a risco e menos orientadas a resultado – o que não é ruim, mas leva a maneiras distintas de encarar projetos (veja mais sobre lógicas conflitantes neste nosso texto aqui). Terceiro, a pouca experiência de mercado faz com que oportunidades e abordagens inovadoras sejam vistas como pouco interessantes de exploração fora do laboratório.

Diante de todo esse desafio, como grande parte dos programas tem endereçado o incentivo à inovação? Programas de filtragem de talentos acadêmicos mais empreendedores – são identificados os poucos cientistas empreendedores e concentram-se neles os esforços para fazer a universidade transbordar sua pesquisa em inovação tecnológica. O problema disso? Muitos dos cientistas que não têm essa veia prévia (devido aos fatores que falamos acima) acabam ficando de fora, mesmo que tivessem algum potencial para isso.

E como abraçar até mesmo esses muitos outros que ficam de fora? Acreditamos no papel dos programas de sensibilização – mecanismos que servem para demonstrar aos poucos as possibilidades de vias de empreendedorismo e inovação para dentro do universo acadêmico. Diferente dos outros programas, cujos prazos e métricas são orientados a casos de sucesso em horizontes de curto prazo, modelos de sensibilização visam “plantar a semente” do empreendedorismo para, quem sabe, lá na frente colher frutos. Um dos motivos pelos quais programas de sensibilização importam é o fato de eles respeitarem o ingrediente “tempo” da mudança na cultura acadêmica. Em vez de tentar forçar programas que desconsideram os desafios de inovação nas universidades (citados acima), programas de sensibilização entendem que o processo de mudança é lento, e que os ciclos de mudança de mentalidade na academia são realmente mais longos do que, por exemplo, dentro de uma organização. Ao respeitar esse tempo de maturação, tais programas criam um terreno fértil para outras mecânicas mais orientadas a filtragem e aceleração de projetos acadêmicos inovadores.

Fellowships: sensibilizando com conexão

Em estudos recentes aqui na Wylinka, nos deparamos com alguns programas muito interessantes de universidades americanas, grande parte deles chamados de “Innovation Fellows”. Usualmente, fellowships são bolsas que financiam a pesquisa de indivíduos alinhados à finalidade do financiador (ex: a Obama Foundation Fellowship financia pesquisadores ligados aos direitos civis), mas então o que seriam os tais Innovation Fellowships? Pelo que percebemos em muitas universidades, como Maryland, Leeds, Richmond e outras, tais programas se assemelham aos Fellowships originais, mas adicionam o tempero de capacitação e contato com práticas/pessoas ligadas a empreendedorismo e inovação. Como falamos acima, são a sementinha inicial para pesquisadores que podem vir a trilhar uma carreira empreendedora.

Mas vai além: fundos de investimento e grandes empresas começaram a abraçar a pauta do Innovation Fellowship, propondo modelos de suporte a pesquisadores que possam ter interface com seus mercados. A Qualcomm, gigante de semicondutores, por exemplo, oferece um fellowship de 12 meses no qual, além da bolsa, os pesquisadores (mestrandos e doutorandos) recebem mentoria dos engenheiros e especialistas de P&D da empresa. Já o pessoal da Accel, um dos maiores fundos de VC do mundo, possui o programa Accel Innovation Scholars, que começou em Stanford, mas hoje concentra-se em Berkeley, apoia 25 pesquisadores por ano com foco em mentorias e capacitação na jornada de criação e financiamento de spin-offs acadêmicas.

O papel do “ingrediente” tempo: o case Piezo Therapeutics

Há cerca de 7 anos, um vídeo no Youtube viralizava demonstrando como dois pesquisadores de Stanford haviam desenvolvido um kit diagnóstico para malária que custava apenas menos de um dólar. Um dos pesquisadores, Saad Bhamla, na época era participante do programa Accel Innovation Scholars em Stanford, demonstrava como uma simples estrutura de papel-cartão era capaz de emular uma centrífuga laboratorial, procedimento necessário para muitos diagnósticos. No vídeo abaixo você pode ver mais obre a invenção:

Saad terminou seu doutorado, bem como o programa da Accel, e seguiu sua trajetória acadêmica para o pós-doutorado em bioengenharia na mesma instituição – e ao terminar o período de pesquisa, foi contratado pela Georgia Tech como professor assistente. Muitos anos depois, Saad já como professor associado na Georgia desenvolve uma tecnologia de injeção de medicamentos por meio de microagulhas e pulsos elétricos, podendo transformar a medicina de ácidos nucleicos. Sua trajetória? Funda uma startup e levanta US$2 milhões para fazê-la dar certo. Esse é o ingrediente tempo que estamos falando: às vezes a mudança de mentalidade pode levar tempo para ocorrer; às vezes o insight técnico de uma deep tech vem muitos anos depois; às vezes a maturidade acadêmica ainda precisa ser desenvolvida etc. Por isso que gostamos de modelos como os Fellowships – no longo prazo, a mágica acontece. E geralmente ela só acontece mesmo no longo prazo.

Um exemplo que vivemos foi o programa Wylinka Experience, em que trazíamos jovens universitários de diversas partes do Brasil para dar uma formação em empreendedorismo e inovação e transformá-los em agentes de fomento ao empreendedorismo em suas regiões. Hoje, após cerca de 7 anos das 2 edições, vemos essa turma em posições como coordenação de novos negócios em grandes empresas, inovação em grandes bancos e muito mais! E é por isso que reforçamos: respeitar o tempo é chave na transformação de ecossistemas de inovação.

E se você quiser construir algo similar conosco, é só entrar em contato com a Anna Bolivar (anna.bolivar@wylinka.org.br). Também não deixe de nos acompanhar nas redes sociais – Linkedin e Instagram, Because when you rock, #wyrock!

Autor: Artur Vilas Boas – Pesquisador na USP em empreendedorismo e inovação (Linkedin)

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