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Áreas de oportunidade de ação em ciência e tecnologia em saúde no Brasil para além do contexto da pandemia

25/maio/2020

Áreas de oportunidade de ação em ciência e tecnologia em saúde no Brasil para além do contexto da pandemia

Na situação de urgência em que vivemos, tentamos ganhar tempo com medidas de distanciamento que nos permitam diminuir a propagação da doença e assim um colapso no sistema, com perdas inimagináveis em vários níveis de nossas vidas. Queremos ganhar tempo para enfrentar devidamente o desafio, o que nos demandará soluções diferentes das que já temos, inovações.

Nesse contexto fica ainda mais clara a importância da ciência e tecnologia, de onde podem vir ideias e soluções definitivas para o desfecho dessa crise. Por outro lado, sabemos que o caminho para que o conhecimento científico chegue de fato a ser uma solução pode ser longo e cheio de percalços.

Nesse momento podemos não ter esse tempo e é preciso entender como encurtar essa jornada. Acompanhando ações de apoio nesse sentido que tem sido implementadas, nesse texto, compartilho minhas percepções a partir da experiência com gestão da inovação vinda da ciência e tecnologia no Brasil, no sentido de contribuir para a busca de ações mais efetivas.

Photo by 鷐 白 on Unsplash

Uma visão do contexto de ciência e tecnologia em saúde no Brasil

Realizamos no ano passado o Deep Tech Saúde, um projeto em parceria com o Núcleo de Política e Gestão Tecnológica da USP (PGT/USP), Associação Samaritano e Instituto Sabin buscando entender o impacto da ciência e tecnologia na saúde, com foco específico em soluções que proporcionem saúde básica, acessível e em escala. Mais informações podem ser encontradas no Ebook Impacto social da ciência e tecnologia no campo da saúde.

Nossos achados a partir de soluções tecnológicas mapeadas em todo o Brasil foram:

  • A maior parte das soluções se encontra em estágio inicial ou ainda não está inserida no mercado, o que demonstra dificuldades para o avanço das pesquisas para próximos estágios de desenvolvimento;
  • Uma pequena parcela das soluções foi projetada com foco em saúde básica, acessível e em escala, apesar de apresentarem potencial para essa aplicação, o que nos indica pouco conhecimento ou interesse de pesquisadores e empreendedores nestes mercados;
  • A avaliação quanto a rapidez de entrada no mercado e efetividade das tecnologias carecem de testes em ambiente real, o que demonstra baixa interação entre a pesquisa e aplicação;
  • A maior dificuldade na aplicação dessas tecnologias para populações menos assistidas é a falta de infraestrutura adequada para sua aplicação, envolvendo desde a carência de equipamentos até condições gerais, como acesso à internet.

Assim, as necessidades-chave encontradas para o desenvolvimento das pesquisas e tecnologias foram: (1) aporte de capital, (2) direcionamento do modelo de negócios para saúde básica, acessível e em escala, (3) parceria para testes e validações em ambiente real e (4) oportunidades e formas de implantação da tecnologia no sistema de saúde.

Como resultado deste trabalho e considerando aprendizados de outras experiências, podem ser apontadas como áreas de oportunidade para potencialização da aplicação de ciência e tecnologia, com ênfase neste momento para o setor de saúde:

#1 Remover as barreiras para implementação de soluções inovadoras no sistema

Soluções inovadoras não conhecidas pelo mercado ou sistema público podem ter consideráveis barreiras de implementação. É preciso considerar e lidar com esta questão desde o momento inicial de desenvolvimento de uma solução inovadora, buscado direcionar as características do produto ou serviço a barreiras menores. É preciso buscar oportunidades de validação e testes em situações reais com usuários e em processos em escala. Entender quem são os clientes e parceiros para produção e envolve-los desde o início para garantir a viabilidade de escala da solução. Para inovações que impactam sistemas inteiros, é necessário envolver os agentes públicos no desenvolvimento, buscando espaços de teste e prototipagem no sistema.

#2 Promover a aplicação efetiva de recursos para a geração de soluções

O recurso muitas vezes não é bem aplicado pelos pesquisadores e empreendedores, não levando de forma efetiva ao desenvolvimento da solução almejada. O trabalho de gestão de recurso para o desenvolvimento tecnológico presume lidar com muitas incertezas técnicas, de gestão e de mercado. Principalmente para pesquisadores e pequenas empresas de base tecnológica, muitas vezes a equipe não tem conhecimentos e habilidades de gestão e de mercado e ainda lida com um contexto de captação e gestão de recursos desafiador.

#3 Aumentar a massa crítica de negócios de base científica e tecnológica, com investimento em etapas do “vale da morte”

Podemos perceber a pouca massa crítica de empresas de base hard science de alto potencial quando as chamadas não alcançam número e qualidade desejáveis de inscrições. No Brasil temos muitas soluções e conhecimento em desenvolvimento na área de saúde, mas que enfrentam o “vale da morte” e não se desenvolvem a ponto de chegarem a ser soluções aplicáveis. No entanto, há um gap de investimento para as etapas de pesquisa em laboratório, prova de conceito e produção do protótipo, que se agrava com a diminuição que os aportes governamentais para C&T vêm sofrendo. É necessário fomentar o desenvolvimento de ideias, negócios e projetos nascidos da ciência, apoiando as fases entre a pesquisa e o teste em campo.

#4 Promover o alinhamento das soluções desenvolvidas com a real demanda da sociedade

É comum que as soluções tecnológicas desenvolvidas não estejam alinhadas às demandas do mercado e da sociedade. Esse problema se aprofunda quando se trata de soluções de impacto social ou para a base da pirâmide. Acontece um distanciamento da atividade de pesquisa da realidade dos problemas e questões que a sociedade e o mercado enfrentam. Normalmente essa lacuna só é percebida quando a empresa já está em estágio avançado de desenvolvimento do produto, quando é mais trabalhoso e oneroso mudar os rumos de desenvolvimento e muito recurso já foi despendido. É preciso promover mais contato dos pesquisadores com os problemas reais e direcionar recursos para o desenvolvimento de soluções de impacto social.

Para além do atual contexto de pandemia, considerando a complexidade dos desafios do sistema de saúde pública no Brasil, é essencial desenvolver soluções inovadoras com foco nas necessidades de uma saúde básica, acessível e em escala para que inovações não aumentem a lacuna de saúde em vez de reduzi-la.

E você, estudante, pesquisador, agente de inovação, agente público e de saúde, o que acredita que podemos fazer pra mudar esse cenário? Escreva aqui embaixo nos comentários!

Se quiser ser parceiro da Wylinka para a implementação de ações que ajudem a mudar esse contexto, é só mandar um email para novosnegocios@wylinka.org.br! 😉

Pra terminar, já viu nosso Deep Talks sobre “Como elevar o impacto social da ciência e da tecnologia no campo da saúde?”. Em parceria com o Núcleo de Política de Gestão Tecnológica (PGT USP), fizemos um debate entre o Prof. Guilherme Ary Plonski (Coordenador Científico do PGT/USP), o Fábio Deboni (Gerente Executivo do Instituto Sabin) e o Marco Bego (Diretor Executivo do Instituto de Radiologia do HC-FM/USP) sobre como potencializar o impacto da ciência e da tecnologia saúde. Veja aqui!

Autora: Ana Carolina Calçado, Diretora-Presidente da Wylinka.

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